“Meu Largo”, a formação jurídica e os novos desafios da advocacia*
18 / Agosto / 2022
Chegamos a mais um ‘11 de agosto’, data dedicada ao estudante, mas também ao advogado. Há exatos 195 anos foram inaugurados os primeiros cursos jurídicos do Brasil: a Faculdade de Direito de Olinda (PE) e a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (SP). Frequentei como estudante esse famoso “Largo” entre 1992 e 1996, testemunhando sua determinante relevância em fatos que marcaram a história do Brasil, como o movimento dos “caras-pintadas”, que levou ao processo de impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello.
Mais do que a formação jurídica da Universidade de São Paulo (USP), as lições que dali herdei remetem a princípios filosóficos, culturais, sociológicos e políticos, tais como os adquiridos pelos 13 ex-alunos que passaram pelos mesmos bancos escolares e se tornaram presidente da república: Prudente de Moraes, Campos Salles, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Wenceslau Braz, Delfim Moreira, Artur Bernardes, Washington Luiz, Júlio Prestes, José Linhares, Nereu Ramos, Jânio Quadros e Michel Temer.
Além da advocacia, tenho me dedicado há quinze anos à formação de novos bacharéis em Direito, na coordenação de cursos jurídicos. Em que pesem as novas tecnologias à disposição da área pedagógica-educacional, muitos desafios permanecem presentes. Os altos índices de reprovação no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a baixa aprovação em concursos públicos para ingresso em carreiras jurídicas denotam a necessidade de permanente reflexão sobre a formação do profissional do Direito.
Vários são os motivos para este preocupante quadro: o aumento exponencial no número de cursos jurídicos no Brasil, os novos contornos da atuação profissional diante da velocidade exigida pela inteligência artificial, as modernas tecnologias do setor nem sempre acompanhadas pela revisão dos projetos acadêmico-pedagógicos dos cursos, o distanciamento entre o que é ensinado nas salas de aula e o que o estudante encontrará na vida real, bem como o escasso nível de leitura provocado pela elevada digitalização dos processos educacionais.
Certamente não há uma só solução para contornar tal quadro. Porém, entendo que seja pertinente lembrar uma lição em sala de aula do ilustre jurista Eros Roberto Grau, então meu professor de Direito Econômico. Sua fala, em 1995, foi mais ou menos nesses termos: “o mais importante aos estudantes é o conhecimento dos princípios gerais do Direito, pois são sobre esses que é construído todo o ordenamento jurídico. Se um profissional da área domina os princípios gerais, ele pode tecer toda a ordem de argumentação, fundamentação e questionamentos.” De fato, ainda que se fale sobre como a tecnologia e o mundo digital interferem positivamente no meio jurídico, trazendo maior celeridade e autonomia aos procedimentos, dominar as bases do Direito parece-me o eterno segredo para bem formar o profissional da área jurídica.
De igual modo, nenhuma inovação ou modernidade jurídica fará com que a ética deixe de ser a principal característica, não só do profissional jurídico, mas também do cidadão. Daí decorrerá a observância de importantes princípios éticos na advocacia: a boa-fé entre as partes, a lealdade processual e a preservação da própria imagem e da categoria.
Parabéns, colegas – estudantes, advogados e operadores de Direito do Brasil – pelo nosso dia!
*Zacaria Alexandre Nassar é bacharel em Direito pelo Largo São Francisco/USP, Mestre em Turismo e Hotelaria (Univali), presidente da Comissão de Direito Aplicado ao Turismo da OAB/SC (gestão 2022/24), advogado atuante em Florianópolis, professor de Legislação Turística e Hoteleira, coordenador dos cursos de Direito (campus Florianópolis), Gastronomia e Turismo (campus Pedra Branca) na UniSul.